São conhecidos como Relógios Complicados todos aqueles que possuem em grande número de peças e, alem de indicarem as horas por meio de seus ponteiros, apresentam um ou mais movimentos através de dispositivos como: calendário, repetição, cronógrafo, corda automática, fases da Lua, despertador, autômatos, etc.
Por volta de 1670 praticamente todos os relógios passaram a ser providos do ponteiro de minutos; até esse ano a grande maioria contava apenas com o ponteiro de horas e poucos eram relógios portáteis que, além do seu mecanismo normal para acionar o ponteiro, possuíam outros movimentos. Após 1675, Huygens, aplicando a espiral no balanço dos relógios, tornou sua marcha mais precisa e bem mais confiável, uma vez que, até então, esse gênero de relógios funcionava precariamente; essa inovação permitiu um maior desenvolvimento na técnica de se complicar os relógios portáteis, agregando-se-lhes peças ou mecanismos suplementares acoplados ao movimento das horas, e incentivou a aplicação de alguns elementos independentes como bússolas, termômetros, barômetros, altímetros, etc. justamente um ano após essa invenção de Huygens, em 1676, os relojoeiros ingleses Quare e Barlow criaram a soneira de repetição batendo horas e quartos, que permitia ouvirem-se as horas, apenas calcando-se o suporte da argola, quantas vezes se desejasse. Essa foi, sem duvida, uma invenção de grande utilidade para a época, pois as fontes de iluminação eram poucas e precárias o que tornava dificílimo consultar-se um relógio à noite para saber-se as horas. Durante o século XVIII os relógios portáteis receberam uma série sucessiva de aperfeiçoamentos mecânicos, que permitiam um progresso apreciável nesse campo. São inúmeros os exemplares de relógios construídos nessa época, notáveis por sua complexidade mecânica. Um relógio muito complicado é o do célebre relojoeiro Gautrim (1739-1799), fabricado para Luiz XVI. Duas faces: em uma a hora, minutos, a data e o dia da semana; na outra face indicação das 24 horas do nascer e do pôr do Sol. Diâmetro 45 mm.
Um outro relógio complicado, muito conhecido por sua historia, é o denominado “Maria Antonieta”. É uma belíssima peça encomendada pela rainha ao famoso relojoeiro Abraham-Louis Breguet (1747-1823). Maria Antonieta desejou possuir mais o mais belo relógio que jamais tinha havido no mundo. Breguet demorou quase 20 anos e fabricou um relógio com todas as complicações conhecidas no século XVIII. Sua máquina batia as horas, quartos e minutos de repetição; calendário perpétuo completo; equação do tempo; ponteiros de horas e minutos e segundos independentes; dispositivo para dar corda automática, sistema pedômetro; indicador reserva de tempo, da corda do relógio; à prova d’água; para-choque; termômetro metálico. Caixa em ouro, vidros de cristal de rocha nos 2 lados; um mostrador em rocha para ser visível o mecanismo; todos os mancais e peças sujeitas ao atrito em safira, sem exceção. O mecanismo inteiramente em ouro maciço, exceto as peças que obrigatoriamente deveriam ser de aço. Mas... tão belo relógio nunca chegou a ser visto por Maria Antonieta, que foi guilhotinada antes da obra acabada.
Os relógios extremamente complicados em geral eram produzidos quase como artesanato e muitos deles por encomenda. Aos poucos, a partir principalmente da primeira metade do século XIX, a fabricação de relógios entrou em fase industrial e, paulatinamente, começaram a desaparecer os relojoeiros artesãos, para dar lugar à produção em alta escala. Mas mesmo assim algumas casas famosas ainda aceitavam encomendas para aceitar peças únicas. Isso foi o que sucedeu com a Casa Leroy, de Paris, que em 1897 recebe uma encomenda do Sr. A. A. de Carvalho Monteiro, português riquíssimo que desejava possuir o relógio de bolso mais complicado do mundo. O programa proposto pelo cliente era efetivamente complexo, mas foi aceito pela Casa Leroy, que demorou 4 anos para realizar a obra. Esse relógio, em caixa de ouro cinzelada, apresentava além da indicação das horas e minutos as seguintes complicações: data; dia da semana; calendário perpétuo dos meses e anos bissextos; indicação do ano durante um século; fases da Lua; estações do ano, solstícios e equinócios; equação do tempo; cronógrafo com retorno a zero, contador de minutos; contador de horas; indicador de reserva da corda; repetição da hora, dos quartos e dos minutos, regulável em som forte, médio e silencio, em 3 notas e com carrilhão; estado do céu no hemisfério boreal no momento do dia indicado pela data, com um céu e um horizonte para Lisboa com 560 estrelas; estado do céu no hemisfério austral e um céu e um horizonte para o Rio de Janeiro com 611 estrelas; a hora de 125 cidades do mundo; a hora do nascer e do pôr do Sol em Lisboa; um termômetro metálico; um higrômetro de cabelo; um barômetro; um altímetro até 5000 metros; um sistema que permite que permite corrigir a regulagem, sem abrir o relógio, e finalmente uma bússola. Tudo isto dentro de uma caixa com 71 mm de diâmetro! O Senhor Carvalho Monteiro pagou pelo relógio, em 1901, 20000 francos, o que representava uma fortuna para a época.
Este extraordinário relógio, perfeito computador mecânico, esteve em Portugal até 1953; depois foi comprado, graças a uma subscrição nacional, por um grupo de franceses que o doou ao Museu de Belas Artes de Besançon, onde se encontra. Em nossos dias, devido à produção em massa procura-se simplificar os relógios mecânicos ou eletromecânicos, agregando-se-lhes o mínimo de complicações, no entanto algumas como a data, dia da semana e corda automática passaram a fazer parte da grande maioria dos relógios. Mas não nos surpreendemos se os relógios eletrônicos puros, sem peças moveis, com display digital de LED ou de cristal liquido LCD, como verdadeiros computadores que são.
Relógio de Erhard Liechti, de Winterthur, Suíça, fabricado por volta de 1572. De execução esmerada, bate horas e quartos, indicando ainda as fases da Lua. Altura 50 cm.
